sábado, 9 de outubro de 2010
► ESPAÇOS
"Gradualmente, ele começa a se testar contra as energias, em lições curtas, como exercícios acrobáticos mal realizados. Uma explosão interna ocorre repentina e inesperadamente. Com uma estranha certeza, ele inicia o ato de liberação dessas forças que o ameaçam do exterior. Ele desenvolve poderes mágicos que o tornam capaz de superar todos os obstáculos, tão imperturbado como um anjo caído. Seus esquemas de fuga formam um balé em defesa da violência suave. O jovem desamparado transforma-se em uma pessoa que, com ajuda de sua mania por intervenções, é capaz de domar as forças dos elementos.”
O tempo passa (time goes by) – Conserto para Anarquia – concert for Anarchy. Los Angeles. Rebecca Horn
A arte cinética de Rebecca Horn
Pela primeira vez no Brasil, a artista alemã Rebecca Horn ocupa o espaço Centro Cultural Banco do Brasil São Paulo com a exposição REBELIÃO EM SILÊNCIO.
► Visitá-la, é um desafio.
Fui sem conhecer. Total desprovido de pré-conceito. Sabia apenas que ela brincava com a Anarquia. Foi o que bastou para sair de casa neste sábado nublado e de garoa. Perfeito para um café e boas companhias. Pelo Facebook convidei a italiana mais bonita de são Paulo para experimentar o que estaria por vir. Da mesma forma fiz com o aprendiz. Não passou pela minha cabeça que ela poderia já conhecer o trabalho da artista. Ela conhecia. Também não passou por minhas reflexões que essa exposição poderia ser um detonador comportamental ao adolescente.
As impressões começam aqui.
Combinamos de nos encontrarmos no marco ZERO de São Paulo. Sugestão advinda da própria italiana. Gostei. Poucas e poucos amigos gostam ou frequentam o Centro de São Paulo por considerar bla bla bla bla.
A catedral da Sé estava sendo ocupada para um casamento, transformação radical. Caminhões, staff, gerador, estruturas metálicas, flores e luz.
( A arquitetura da beleza é luz e paz)
Caminhamos lentamente pelo proselitismo sonoro que dominava todas as pétalas da rosa dos ventos desenhada no chão sujo e cheio de moradores de rua. O espaço era demarcado por quadrados pré estabelecidos – riscados de giz em chão católico. Eram os pastores para um rebanho surdo, cego, mudo. Morto.
Passamos.
Entramos na Mãe Preta (apelido dado pelos moradores de rua que em noite fria usam parte do prédio, em mármore preto, para se abrigarem), Centro Cultural Caixa.
O título de uma das exposições nos despertou o interesse e curiosidade: OCA MALOCA, de Maria Tomaselli & João Melquíades. Nosso primeiro segundo observar iniciava-se. Não mais organizado que a Praça da Sé, as galerias dispunham quadros e esculturas espalhados pelos três andares. A Caixa Cultural tem 6 anos e até a presente data ainda não conseguiu resolver problemas básicos quanto a estruturação e organização ao espaço expositivo. Falta percepção estética organizacional ao funcionário estatal que ocupa o cargo curatorial. Cacófatos visuais. Falta educação. Refiro-me a exposição térrea da qual o nome nem mesmo me lembro. O fato é que tivemos que procurar por uns três minutos onde é que estava a ficha técnica das obras expostas em um dos totens. Erro básico. Detalhe. Acabamento e delicadeza são o que faltam em todo o espaço Caixa Cultural – espaço público financiado com dinheiro público de cujas remessas de quantias monetárias são garantidas pela Caixa Econômica Federal que tem, como diretor geral em São Paulo, o Senhor Elcio Mendes de Paiva.
Entretanto a exposição, ainda no mesmo lugar, “Xilogravuras de João Pedro de Juazeiro” recria um espaço bastante orgânico. Folhas no chão trazem o cheiro de mato, lembrança de uma infância saudável. Cores de criança, linhas sensíveis e diretas. Claras. É o simples. Obvio necessário.
Assim saímos desse espaço. Já tínhamos reorganizado todas as imagens, cheiros, sons que a Praça da Sé nos deu. Riqueza. Saíamos da Caixa Cultural sabendo que existe Céu e Inferno. Tudo ficou simples.
► Até chegarmos em Rebecca Horn.
Ao entrarmos fomos recebidos por um piano que vomitava dependurado ao teto. O chão era lustroso. Minúsculos quadriculados a formar um gigantesco mosaico. Barulho não existia. O que existe é GRITO. Seguranças por toda a parte. Não me lembrava do tamanho deles. Ainda não consigo distinguir essa impressão: os seguranças estavam mais violentos porque a empresa terceirizada mudou ou as obras de Horn haviam já os influenciados de tal modo que seu comportamento refletia violência, sexo e sensibilidade. Era isso que seus corpos diziam.
A exposição não tem catálogo, uma pena. Um estúpido e pobre erro administrativo.
Subimos de escada até o terceiro andar. Depois do piano, começávamos andar por andar. De baixo para cima, ao céu. Desde que adentramos por aquelas portas, com ramos de café em ferro, céu não mais existia.
Facas, borboleta, LOVE, panóptico, conchas, pênis e arma. A REBELIÃO EM SILÊNCIO é puro grito.
Inocente é aquele que não escuta uma imagem. Existem imagens que gritam mais alto que o grito de uma multidão. Nesta exposição, quando comparamos com a polifonia da Praça da Sé, podemos chegar a conclusão de que a Praça da Sé é música orgânica e repleta de paz. A violência está no racionalismo, na organização do ódio. É o que Rebecca faz. Chega a fazer tão bem que anima seres inanimados. Traz à vida objetos, máquinas estupidas que com carinho parecem bichos de estimação. Rebecca Horn transborda vida, complexidade.
A vida coisificada, e não o contrário, é o que realmente pode ser chamado de paradoxo neste caso.
Rebecca Horn é mais suja e violenta que a Praça da Sé, por isso é tão delicada.
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